Filhos, vou contar-vos um segredo. Todos temos dentro de nós uma vozinha. Chamam-lhe a voz interior, a nossa consciência. Damos, muitas vezes, ouvidos a essa voz. Mesmo quando não devemos. Escutamos, ainda melhor, sempre que a vozinha nos tenta magoar, ou nos relembra as nossas supostas falhas. Essa voz, pode até ajudar-nos a resolver alguns dos obstáculos que vão surgindo ao longo da vida, mas também nos impede de voar mais alto, também nos deixa sem chão e também nos faz recuar quando vamos todos lançados em frente. Quando vamos levantar a perna, a vozinha lá nós recorda que de como somos. A voz é perita em rótulos. Conhece-os todos e nunca nos falha. A voz sabe as nossas limitações e torna-as ainda mais exacerbadas, ela gosta de exagerar.

O meu segredo é simples. Essa vozinha, não é vossa. Essa vozinha alimentou-se das vozes dos outros. Ao longo de toda a vossa vida. A voz está sempre atenta, coleciona elogios, mas acima de tudo, coleciona críticas! O que a nossa vozinha interior mais adora, são as coisas ditas da boca para fora. Aquelas que magoam sem razão. Aquelas que nos dizem, ainda que jamais nos pudessem definir. A nossa voz interior é masoquista, talvez lhe chame assim. Gosta do que faz doer.

E sabem, nós os pais, temos um papel daqueles mesmo importantes na formação da vossa vozinha interior. Diria até que ficámos com o papel principal. É uma enorme responsabilidade, não é? É que a vozinha está ainda mais atenta nos primeiros anos de vida, quando talvez vocês ainda nem a saibam escutar, muito menos calar. Por isso, ela está lá, sorrateira, a absorver tudo, a escutar atentamente, a tentar definir quem são vocês. Serão mesmo teimosos? Terríveis? Birrentos? Não param quietos nunca. Talvez isso seja mau, certo? Um de vocês é mais extrovertido, o outro mais tímido. Um de vocês é mais fácil, outro mais exigente.

O pior de tudo é que nem sempre falo a verdade. Eu irrito-me, mais do que devia. Eu fico cansada, por muito que tente disfarçar. Às vezes, não consigo ser a mãe que quero, mas a mãe que é possível. E, nesses dias, talvez eu diga coisas que gostava que a vossa vozinha interior não registasse. Eram só umas parvoíces sem valor. Mas eu sei, a maldita não descansa, ela está sempre atenta! A ela, nada lhe escapa.

É uma enorme responsabilidade que nós temos. Garantir que a vossa vozinha interior venha a ser uma verdadeira conselheira, que vos relembre, um dia, o quanto são amados. Gostava que ela escutasse sempre que digo que vos amo independentemente de tudo. Digo-vos, muitas vezes, que mesmo que façam mil disparates, que nunca façam o que eu digo, mesmo quando me zango ou grito, mesmo quando digo parvoíces, o amor está sempre lá. Espero que seja isto que ela ouve. Que podem ser mesmo quem quiserem ser. Que não importa assim tanto o que o vão pensar de vocês. Que podem vestir uma coisa qualquer. Que podem pintar o sol de azul. Que vocês são os dois, seres humanos únicos e maravilhosos só por isso mesmo, porque ninguém é igual a vocês. Nunca.

Espero que a vossa vozinha interior ouça também tudo o de bom que vos digo todos os dias. Mas eu sei, lá no fundo, o quão difícil é não vos atribuir nenhum rótulo. Por isso, saibam este segredo, essa vozinha pode ser calada um dia, porque essa vozinha não é só vossa, é minha, é nossa, é a de muitas pessoas que se cruzam na vossa vida. O que ela não sabe é que vocês são perfeitos, porque mesmo cheios de defeitos, não haverá nunca ninguém igual!