Não, não deixei a vida para trás. A minha vida não ficou em espera, pelo contrário, eu só não quis ter que colocar os meus filhos à minha espera, porque eu sei que eles não esperavam. Podia pedir-lhes que parassem de crescer tão rápido. Podia pedir-lhes para não fazerem nada de especial enquanto eu estivesse ausente, que guardassem todas as gracinhas para mim, os sorrisos, os primeiros passos, a primeira vez que encaixam uma peça do jogo no sítio certo e batem palmas, a primeira vez que descobrem que conseguem chegar mais longe, trepar, correr, os desenhos que fazem e querem mostrar de imediato, a forma como olham o mundo e o tentam compreender, as primeiras palavras… mas eles não iam poder esperar, eu percebi que a vida não espera por nós. Nunca.

O que menos gostava quando o ia buscar à escola quando ele era demasiado bebé para lá estar, era escutar o que ele tinha feito. Não me interpretem mal, eu adorava saber, mas gostava de ter sido eu a ver. Sentia que alguém me descrevia o melhor do meu próprio filho. E tudo o que eu não saberia nunca? E de todas as vezes que ele terá feito uma pequena conquista e não tinha ninguém para o ver? E o colo que ele talvez tenha precisado sem poder explicar? Teria ele saudades minhas como eu tinha dele?

Um dia, deixei de os colocar a eles em espera. A vida não espera por ninguém, mas pelo menos agora eu não espero para ninguém me contar como ela cresceu. Eu assisto a tudo, na primeira fila. Estou onde mais precisam de mim.

Falam-me do que abdiquei, do que deixei para trás, da vida que deixei parada, do futuro incerto. Mas o que não compreendem é que eu só deixei de abdicar deles, das pessoas mais importantes para mim, daqueles que precisam de mim.

Sim, penso no futuro. Um dia, não muito distante, eles deixam de precisar tanto de mim. Um dia, precisarei de me voltar a encontrar. Um dia, precisarei de trabalhar. E se não conseguir voltar a trabalhar na minha área? E se a vida der uma volta que eu não estou a contar, e eu precise mesmo de passar o dia longe deles? E se um dia for demasiado difícil deixar de ser quem hoje sou? Penso nisso, sim, mas nunca ao ponto de isso ser mais importante do que o presente. Porque quando sabemos que estamos a desempenhar o papel que nos realiza, que nos completa, que nos desafia, que nos dá vida, que não faz ter vontade de acordar de manhã, que nos dá certezas que é isto que queríamos ser quando fôssemos grandes, então arrisca-se tudo!

Questionam muito a minha decisão, talvez porque o mundo não está feito da melhor forma. Talvez porque se entende que ver os filhos crescer, estar ao lado deles nos primeiros anos de vida, ser colo e alimento, ajudá-los a compreender que mundo, estar lá quando precisam, ensinar-lhes o mais valioso, ajudá-los a ganhar asas, não é vida. Não é como um emprego de verdade. Talvez se o mundo entendesse isto, todas as mães pudessem estar ao lado dos filhos, na única fase da vida em que nada as substitui. Em vez disso, a maioria das mães não pode sequer considerar essa opção.

Talvez eu não tivesse tantas vezes que responder à pergunta “Como foste capaz de deixar a tua vida em espera?”. Eu não fui foi capaz de deixar a minha vida esperar mais, porque a minha vida são eles.