É sempre desafiante escrever sobre parentalidade, como educar um filho, as brincadeiras que podemos praticar com o nosso bebé de 10 meses… ou qualquer outra coisa que tenha a ver com algo tão pessoal como a nossa experiência de pai e mãe. O que sinto é que tentamos sempre escrever algo perfeito e duradouro. De certa forma, isto reflete a nossa atitude enquanto pais: procurar criar as condições perfeitas para que os nossos filhos tenham vidas perfeitas.

Obviamente que tudo isto é praticamente inalcançável. Este projeto da Mãe Andreia Davide esteve muito tempo em gestação até se tornar realidade. À espera da altura perfeita, dos conteúdos perfeitos, do estilo perfeito, do tom perfeito, dos convidados perfeitos… Contudo, no final, este blog passou de ideia a realidade em apenas alguns dias. E assim, simplesmente é. E como não há palavras perfeitas para começar “No Colo do Pai”, fica um texto com ideias soltas dos últimos 3 anos, que simplesmente são.

A banda sonora da tua vida

Nos primeiros meses existe a omnipresente sensação de estarmos numa qualquer montagem numa comédia romântica de Domingo à tarde, com uma banda sonora divertida e otimista sempre em pano de fundo. Stress, fraldas sujas, noites sem dormir, dúvidas a toda hora, tudo isso pesa e afeta as vivências no dia-a-dia. Contudo, e apenas com a experiência de um filho, posso confirmar que a cascata de afetos que temos para oferecer dá uma força suplementar para ultrapassar toda e qualquer barreira. Tudo é… perfeito?

Não só porque “tem de ser” mas porque assim queremos que seja. E fazemos por isso. Importa realçar que, apesar do primeiro filho ser uma experiência única “a dois”, a divisão desta parte do “fazemos por isso” não é em duas partes iguais. Se nas mães corre um caudal de emoções constantes, os pais têm de se tornar firmes o suficiente para suportar a estabilidade de uma nova família.

A banda sonora toca mais baixinho agora, mas nos momentos importantes, de maior dúvida ou frustração, basta procurar por ela, subir o volume, e esperar o regresso dos sorrisos.

A.G.

Antes de ter um filho, sempre pensei que percebia o nível de compromisso que era necessário. Tudo o que iria envolver. Felizmente, pude acompanhar o crescimento de primos próximos numa fase em que já conseguia (pensava eu) perceber todas as coisas que estavam em jogo ao colocar uma criança neste mundo. Todos os pais, especialmente os recém-pais, brincam com os futuros pais sobre as noites sem dormir, a (enorme) quantidade de fraldas para mudar ou o ter de esperar pelo arroto do bebe no fim da refeição1. Eu sabia mudar fraldas, sabia por um bebe a arrotar e até me safava bem a dormir pouco. Bem… como estava errado…

Na era agora chamada Antes do Guilherme (A.G.), a minha carreira ocupava a maior parte do meu tempo ativo, quer fosse mesmo a trabalhar ou a pensar em algo relacionado com a minha área de trabalho. Sucintamente, eram essas as preocupações e interesses que me faziam mexer. Além disto, o tempo de qualidade com a minha mulher ou o tempo despendido a ver filmes e/ou séries2, ocupavam o resto das horas disponíveis. E era muito tempo.

Imediatamente após o nascimento do Guilherme – Depois do Guilherme (D.G.) – tudo mudou. A importância que dava ao trabalho reduziu significativamente para um cantinho algures. E tudo na vida ficou mais claro. Uma claridade que acho que só é possível ter depois de sermos pais. Sobre o que realmente importa, o que nos faz levantar de manhã e correr todo o dia até voltar a cair na cama.

Relativamente ao trabalho, após um período complicado na minha posição anterior, houve uma mudança pragmática na minha perspetiva de compromisso diário. A eficiência e a eficácia são agora palavras-chave, e já consegui otimizar o meu dia para conseguir ser produtivo sem estar demasiado ocupado para ter algum tempo de qualidade “em casa”. Acima de tudo, para mim importa estar presente. Apesar de estar numa posição privilegiada com um horário bastante flexível, é claro que preferia conseguir estar mais cedo na empresa ou aguentar um pouco mais ao final do dia, mas é tão difícil dizer “não” quando o teu filho te puxa pela mão para dar mais uns chutos na bola às 8 da manhã…

A minha estratégia passa por tentar reservar um pouco da noite para planear bem o trabalho do dia seguinte e ir “adiantando serviço”. A desvantagem aqui é o resto, o que falta em casa.

Em casa, 23h

Com tanta coisa em jogo, importa não esquecer um dos maiores stresses da parentalidade, tanto para pais como para mães: colocar o nosso filho em primeiríssimo lugar afasta todas as outras responsabilidades. Com um filho em casa a esgotar todas as nossas energias, torna-se muito complicado conseguir arranjar disponibilidade emocional e intelectual para dar atenção à minha mulher, naqueles preciosas horas entre o Guilherme estar a dormir e nós termos de nos arrastar para a cama, para ter uma conversa de adultos.

E isto torna-se cada dia mais evidente com o Guilherme a necessitar de mais e mais energia. Já não é só mudar e fraldas e embalá-lo. É preciso dançar, cozinhar (e tratar da cozinha depois), correr, ir às compras, andar no “cavalinho”, ler, despejar o lixo, colar autocolantes ou pintar balões.

Confesso que ainda estou a trabalhar nesta parte e isto é, sem dúvida, uma das áreas de melhoria pessoal mais desafiantes enquanto Pai. Mas, saber que temos um problema e entendê-lo, é um primeiro passo para encontrar uma solução.

É evidente que sou apenas mais um entre muitos (felizmente!) a perceber a importância da divisão de tarefas em casa, e tudo o que isso acrescenta e subtrai. Não sou nem ouso ser nenhuma entidade especialista no assunto. Mas, à medida que o Gui vai crescendo, apercebo-me que ele nos observa e aprende com as nossas ações. Não é só imitar a forma como rimos ou forçar a tosse quando tossimos: somos, literal e figurativamente, um exemplo para os nossos filhos. E para mim, com tudo o que li e vivi, a ideia do meu filho ser um espelho das minhas piores qualidades é motivação mais do que suficiente para levantar o rabo da cama amanhã de manhã e fazer o máximo para tornar o dia da minha família mais feliz.

Depois de 20 meses, não sei se somos pais espetaculares, mas o Gui é um menino espetacular, e não consigo pensar em companhia melhor do que a da minha família para estar ao meu lado todos os dias.

Vou estar por cá sempre às segundas segundas-feiras de cada mês (e mais uns dias aqui e ali de vez em quando) para tratar de todas as pontas soltas deste primeiro artigo e levantar o véu sobre o que tento fazer para sermos melhores Pais todos os dias.

  1. No fundo, é uma espécie de praxe. Um passa-a-palavra. As coisas boas rapidamente ultrapassam estes pequenos traumas e os pais rapidamente se esquecem do que aconteceu. Mas é bom reforçar estes avisos aos pais de primeira viagem. (Discordo, mas admito que já o fiz.) ↩︎
  2. Uma quantidade tão grande que agora nem consigo imaginar como tinha mesmo tanto tempo para ver tanta coisa com tanta variedade, de cinema francês de qualidade a filmes americanos da treta passando por um leque diverso de séries… ↩︎