Passou 1 ano desde que a lei mudou, mas muito pouco mudou nas pessoas e nos espaços públicos em geral.

Devia ser apenas o civismo a mover as pessoas. Isso bastava. Mas quando isso não funciona, é obrigatório ceder passagem a idosos com mais de 65 anos e com limitações perceptíveis, a deficientes que sejam portadores de comprovativo de incapacidade igual ou superior a 60% e os acompanhantes de crianças de colo com idade igual ou inferior a 2 anos.

o b r i g a t ó r i o

Não se trata de mania ou capricho. É a lei. E se a mesma lei não for cumprida, podemos (e devemos) chamar a autoridade e apresentar queixa. Sim, isto são casos extremos, sim existem excepções, sim sim sim. Mas a verdade é que quem acaba por se sentir mal no meio de tudo isto é a pessoa que tem prioridade. São olhadas de lado, ouvem bocas, têm que levar com as outras pessoas que fazem de tudo para ignorar que está alguém com prioridade atrás. Preferem passar a fila toda com a cara enfiada nos sapatos, a terem que ceder a vez a alguém que nitidamente tem prioridade.

Depois temos também as pessoas que trabalham nos serviços, mas que lhes falta o tal civismo e, por isso, se recusam a dar prioridade. Fingem que não vêem, fazem um ar compenetrado na tarefa, ignoram, e se for preciso ainda fazem um olhar reprovador. Afirmam que se a pessoa com prioridade quer passar, deve avisar e pedir (sendo que por lei, não é bem assim).

E depois o pior de todos os cenários, as pessoas que ficam a comentar alto e bom som, que mandam bocas de mau gosto, incluindo os próprios funcionários. Eu raramente uso a prioridade a que tenho direito. Não é capricho. É um direito. Não uso porque normalmente tenho tempo, ando sem pressa com a Laura e posso esperar numa fila, não uso porque me aguento bem em pé, não tenho limitações físicas, ando com a Laura no pano e ela raramente está a chorar, por isso, recuso muitas vezes passar à frente. Felizmente, há ainda muita gente educada, prestável, cívica. Muitas vezes encontro funcionários que se prestam imediatamente a ajudar, até mesmo a colocar as compras no tapete, especialmente porque tenho sempre a Laura no pano comigo. Mas hoje estou irritada. É Natal e definitivamente o espírito não desceu sobre as pessoas. Nos últimos dias foram só situações desagradáveis. Num dia destes estava na Sephora, numa fila enorme, com a Laura na mochila. Atrás de mim apareceu uma senhora com uma muleta, não sei qual o problema dela obviamente, mas carregava um dos cestos da Sephora e aguardava na fila. Tentei ceder-lhe a passagem. A senhora obrigou-me a usar a minha prioridade. Insistiu. Até que chamou mesmo a atenção para a senhora da caixa que estava uma mãe com uma bebé no colo. A Laura estava a chorar. Acabei por passar, super encavacada. Mas a senhora tinha razão, disse que eu não tinha que me sentir mal, que quem se devia sentir mal era quem estava na fila e não cedia a passagem. Depois disso, estava numa fila do hipermercado, também com a Laura irritada, e tentaram ceder a passagem, eu agradeci e recusei, disse que esperava. Uma miúda que tinha uns 12 anos, insistiu imenso com a mãe, que encolheu os ombros e fez má cara. A rapariga ficou incomodada. Uma funcionária acabou por abrir outra caixa para nos atender e foi das tais que até ajudou. A miúda continuou “pede desculpa à senhora” e a mãe ainda lhe ralhou. Ainda dizem que a juventude está perdida, mas felizmente parece que não. Hoje fui aos correios. Detesto ir, até hoje, desde grávida a com filhos ao colo, nunca fui bem vista por passar à frente. Estava imensa gente, alguns idosos é certo, ninguém com aparente dificuldade motora, a maioria na conversa com vizinhos, uma tarde bem passada nos CTT. Eu tirei a senha. Aguardei a minha vez. Todos os 4 funcionários me viram, mas ignoraram e eu fui esperando. Até que a Laura começou num berreiro enorme, uma amável senhora até lhe ofereceu pão para ajudar. Até que um dos funcionários me pergunta se quero passar “a menina jovem de bebé ao colo quer passar?”. Aceitei. A Laura estava a chorar, tinha o Gui à minha espera. Até que começam os comentários, vindos do próprio funcionário. “Que vergonha, gente jovem passar à frente só porque tem filhos” ou “no meu tempo ia com vários filhos a todo o lado e não havia nada disto”. Tudo isto na minha cara. Eu admito, sou péssima a lidar com estas situações, mantive a postura, paguei, mas não saí sem antes ouvir mais um comentário “nem agradece, pouca vergonha”. Eu agradeci, ao senhor mal educado. À senhora imensamente amável que esteve sempre a tentar distrair a Laura. Quando passo à frente num fila de hipermercado, peço sempre desculpa e agradeço, na maioria das vezes só levo com olhares zangados. Não agradeci a uns correios cheios de gente, quando só usufruí de um direito meu. Um direito que raramente uso. Um direito que eu acho que é quase vergonha estar na lei! O bom senso devia ser suficiente. No meio de tudo isto, eu é que me fiquei a sentir mal. Não sei exatamente porquê. Não devia ser assim. Não se sintam mal. Não se inibam. Exijam. Só assim podemos fazer a diferença. Já não é só civismo. É lei.