Ser mãe fez-me perceber que muito daquilo que corre mal está ligado às expectativas, nossas e de quem nos rodeia. Fazemos um plano mental, traçamos objetivos, tentamos dar o nosso máximo, queremos o melhor para os nossos filhos e isso gera expectativas.

Quando publicamos partes da nossa vida publicamente, essas expectativas também acabam por acontecer da parte de quem nos lê e depois nos encontra na rua, por exemplo, a ideia de que iremos (assim como os nossos filhos) corresponder a uma determinada imagem.

Hoje foi um dia muito bom, passado entre amigos. Com muitas partilhas, risadas, olhares de compreensão, como já me habituei no Playgroup que frequentamos. Mas foi também um dia difícil, pela tal gestão de expectativas. Começou quando o Gui escolheu ir à escola, está tudo certo, e eu fico feliz por ver que ele se sente assim, mas esperava poder passar o dia com os dois e tive que traçar um novo plano. Depois a Laura veio-me ensinar tantas coisas novas. Não me quero alongar sobre a personalidade de cada um deles, porque detesto rótulos e escrevo, maioritariamente para eles e para que eles me leiam um dia, e não gostaria que vissem que os descrevo de uma determinada forma, até porque eles mudam a cada instante. Mas a verdade é que eles são muito diferentes um do outro, e ainda bem. A Laura não se ambienta tão rápido a novos lugares e não reage propriamente bem quando é abordada por pessoas estranhas, ao contrário do Gui. Ela leva muito tempo até se sentir à vontade e tem muitas formas de reagir para demonstrar que está desconfortável, vai desde fechar-se em mim, até chorar e se atirar ao chão num pranto sem fim.

Mentiria se dissesse que lido sempre bem com isso, não lido. Às vezes quero desaparecer. Às vezes fico triste. Às vezes não sei como a ajudar. E às vezes fico irritada, por achar que ela me está também a falhar. Muitas vezes insisto, porque sei que ela acaba por gostar, porque a conheço, porque mesmo que na hora não o saiba demonstrar, eu vejo o entusiasmo com que ela fala nisso em casa, sobre aquilo que aprendeu. Vejo o que ela conta ao pai quando ele chega, a euforia enquanto lhe diz que foi à música, ou que brincou com alguém. Ela adora cantar, dançar, em casa ninguém a cala. Na rua, mesmo entre pessoas que até já conhece, dificilmente se sentirá bem para o fazer.

Hoje estivemos num lugar que ela não conhece, com música, carrosséis, atividades diferentes e vários animadores prontos a tentar brincar com ela. A verdade é que não correu lá muito bem, ela não quis participar e retraiu-se grande parte do tempo. Há todo um trabalho da minha parte a fazer nesses momentos. Eu preciso gerir as expectativas, preciso de esquecer o “eu fiz isto por ti e agora estás assim”, porque nunca lhe devemos cobrar um esforço da nossa parte que fizemos porque queremos. E porque, no fundo, acabamos por estar a gerir algo que vem de fora, dos outros, e não de nós. Ela acaba por se soltar e o balanço é quase sempre positivo e é, por isso, que eu continuo, que eu a tento ajudar a superar essa parte, fazendo um esforço constante para não rotular de tímida, por exemplo.

Depois o dia terminou com ela a não aceitar estar na aula aberta de teatro do irmão. Eu queria assistir, e senti que era também importante para o Gui, e aí sim eu tenho mais dificuldade em gerir o que sinto. Envolve os dois e quando ela não me deixa estar presente para ambos, começo a ficar nervosa e sem paciência e isso acaba por piorar o estado dela. Fez-me sair da sala e, por instantes, apeteceu-me começar a chorar com ela, queria estar lá dentro, queria que, por uma só vez, ela não me fizesse a mesma cena em todos os lugares. Acabei por senta-la à porta da sala, do lado de fora, e eu do lado de dentro com a porta entreaberta. Dei-lhe o tempo dela e ela acabou por entrar. Não estive tão presente, e isso deixou-me frustrada e é em dias assim que sinto que ela me preenche demasiado, não me deixa o mesmo espaço para também estar com o Gui, ou até mesmo comigo própria.

Amanhã tudo passa, amanhã aprendo mais alguma coisa. Um dia destes volta a correr tudo bem e eu volto a sentir que está tudo no seu lugar. E esta tem sido a maior lição enquanto mãe, saber que os dias de incertezas não duram sempre, que às vezes nos sentimos as melhores mães do mundo também, e que não há fase que não termine. No final, sinto sempre que eles cresceram, mas que fui eu quem mais aprendeu.

(No meio do caos, já em casa, com os dois a chorar, parei no tempo, sem falar. Ela parou de chorar. Trouxe-lhe os brinquedos que ele não queria pegar. Foi buscar outros. Primeiro um nenuco, depois os carros. Até ele parar. E é sempre isso que me dá forças).