Apetece-me dizer-te isso às vezes. Quando te observo a pele mais enrugada, ou quando te vejo repetir uma coisa que já me tinhas dito antes. Vêm-me à memórias as conversas de criança, quando eu te perguntava quando ias morrer, tu dizias que era só quando fosses velhinha e isso parecia-me tão longe. Tu parecias-me para sempre. Impossível não chocar com o teu feitio forte, para não te chamar teimosa, não fica bonito. Mas depois há o resto, aquela presença na minha vida, a voz que não se esquece, tudo o que me ensinaste, os anos ao teu lado dia após dia, a vida, é isso mesmo, é a vida contigo. E quando é assim, não sabemos como é viver sem essa pessoa. Nunca imaginei uma vida em que não existes e agora que repetes os anos e falas na morte, apetece-me dizer-te que ai de ti que me morras. Não podes. Não faz sentido na minha cabeça. Os miúdos já te adoram tanto quanto eu, não haveria como explicar.

Ai de ti que me morras. Eu que agora aprendi a viver as pessoas mais do que a vida, estou o tempo que quero, com quem quero, e tenho-te tanta vez mais perto. A vida é só isso, o tempo que estamos ao lado dos nossos, o tempo nunca nos faltou, mas se um dia me faltas, vou achar que te devia ter aproveitado ainda mais.

Não me morras, porque ainda encaixo no teu colo. E dizem que o colo, e os avós, são para sempre.