” Ainda está muito atrasada! Vamos ter que induzir para a semana!”
Foram estas as palavras que ouvi, exatamente há um ano atrás, vindas da médica que seguiu a gravidez da Laura. Eu adoro-a, é profissional, é dedicada, é muito competente e eu confio nela. Mas, tal como tantos outros obstetras e profissionais de saúde, deixou de acreditar que as mulheres sabem parir.
Assim que me sentei no consultório dela na primeira consulta, disse-lhe que desta vez ia ser diferente. O meu marido completou com “Queremos um parto natural”. Ela sorriu, disse que uma coisa de cada vez, o caminho era longo. Mas eu sabia, acontecesse o que acontecesse, iamos deixar as coisas seguirem o seu rumo, sem intervenções, a não ser que inevitáveis e realmente necessárias.
Felizmente, tudo fluiu como esperado. A gravidez correu bem, passou a voar, a barriga foi crescendo, juntamente com a ansiedade de conhecermos a nossa filha. Sabíamos onde queríamos que ela nascesse. No primeiro instante em que entrei na sala de partos do Centro Hospitalar da Póvoa de Varzim e falei com a Enfermeia e doula Patricia Souto, soube que era ali que a Laura ia nascer. Faríamos de tudo para que isso fosse possível.
Fiz poucas exigências à minha médica, mas uma delas era irrefutável. Não aceitava toques “dos maldosos” como eles dizem. Não queria nada que acelerasse o parto. Induzir, só por razões médicas. Queríamos esperar o momento, queríamos deixar que a Laura estivesse pronta.
Há um ano atrás, pela primeira vez, saí completamente desmoralizada de uma consulta. Sabia que não ia voltar, que dali, só para a Laura nascer e seria na Póvoa. Mas, inevitavelmente, começaram as dúvidas. Senti medo de não saber parir. Não passei pelo trabalho de parto do Gui, talvez o meu corpo não fosse capaz. Vieram os receios todos. No grupo de mães com quem partilhei a gravidez, via várias induções e partos que não pareciam correr como esperado. Senti o medo nos meus familiares e amigos próximos. E chorei, chorei muito por imaginar que o parto com que sonhei não ia acontecer, chorei por pensar que talvez a Laura não fosse nascer como indealizei, chorei por achar que não era capaz de entrar em trabalho de parto.
Valeu-me o apoio do marido, que me garantiu que estava tudo bem. Valeram-me as palavras de apoio de doulas e amigas. Valeu-me o gelado gigante que devorei numa esplanada, num dia quente, exatamente como o de hoje.
Deitei-me mais serena, susurrei à Laura que estava pronta para esperar, até onde ela quisesse ir. Uma horas depois, começaram as contrações. Não estava nada atrasada, porque ela não tinha hora marcada, a médica enganou-se!
Chega de deitar as mulheres abaixo, de nos fazer sentir que não somos capazes sem ajuda, de nos fazer sentir incapazes, de nos fazer sentir que não controlamos o nosso corpo. Chega de procedimentos não consentidos, de intervenções desnecessárias, chega de médicos que colaboram com o acelerar do parto por motivos de férias, ou datas que parecem dar mais jeito aos pais. Os bebés sabem nascer, as mães sabem parir. A medicina, essa é fundamental para salvar mães e bebés em situações que assim o exigem. Mas nunca poderemos deixar que sejam a regra, quando deveriam ser a excepção.
Talvez um dia as mulheres não saibam parir. Mas eu soube. A Laura soube o que fazer. E foi perfeito, mesmo a tempo. O tempo dela.
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